O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ) manteve a absolvição de uma mulher que usou duas cartas psicografadas como prova de defesa. As cartas utilizadas pela dona-de-casa Iara Marques Barcelos foram psicografadas pela vítima do crime.
A decisão foi da 1ª Câmara Criminal do TJ, que respondeu a recurso impetrado pela acusação e pelo Ministério Público Estadual. Iara havia sido absolvida em maio de 2006.
Iara era acusada de participação no homicídio do tabelião Ercy da Silva Cardoso, ocorrido em junho de 2003. Cardoso foi morto com dois tiros na cabeça, em Itapuã. A dona-de-casa e Leandro da Rocha Almeida, caseiro da vítima, foram acusados como autores do homicídio - Iara foi apontada como a mandante do crime.
Ela mantinha um romance com o tabelião e, segundo o caseiro, o teria contratado para "dar um susto" na vítima. Leandro, que depois voltou atrás na acusação, foi condenado a 15 anos de reclusão em processo que tramitou em separado na Justiça.
A acusação entrou com recurso alegando que o primeiro veredicto foi contrário às provas apresentadas durante o julgamento. Porém, para os desembargadores, não há necessidade de um novo julgamento. "Não há elementos no processo para concluir que o julgamento foi contrário às provas dos autos", diz o despacho dos juízes.
O relator do caso, desembargador Manuel José Martinez Lucas, disse que a utilização da carta psicografada na defesa da acusada respeita o livre exercício da religião no país. "É [um direito] protegido constitucionalmente. Cada um dos jurados pode avaliar os fatos levantados no processo conforme suas convicções", defendeu Martinez.
O magistrado justificou a decisão dizendo que havia no processo apenas "resquícios" de autoria do crime pela acusada. Segundo ele, os indícios da participação de Iara eram suficientes para a denúncia, mas não para uma eventual condenação.
O presidente da 11ª Câmara Criminal, desembargador Marco Antonio Ribeiro de Oliveira, avaliou que havia provas tanto para a condenação quanto para a absolvição de Iara. "A decisão do júri, nesse sentido, não é contrária de forma nenhuma às provas constantes dos autos", justificou.
O advogado de Iara, Lúcio de Constantino, disse que já esperava a decisão. "Os documentos foram apresentados no prazo legal e não foi pedida a impugnação durante o processo", avaliou o advogado. Para Constantino, as cartas representaram um fator de desequilíbrio no julgamento. "Foram fundamentais para a minha defesa", disse.
Segundo ele, a decisão dos jurados é soberana. "Uma eventual reforma na decisão dos jurados deve ter o apoio extremamente complexo de uma prova direcionada. Nesse caso, hão houve essa prova", sustentou.
O presidente da Associação Jurídico-Espírita do Rio Grande do Sul, Marcus Vinícius Severo da Silva, lembrou que outras cartas psicografadas já serviram como prova de inocência - o caso mais notório envolveu o médium Chico Xavier. "Foi uma prova que ajudou na absolvição de um inocente", defendeu Silva.
O criminalista Nereu Lima também concorda com a decisão do TJ. "Qualquer prova, desde que seja obtida de forma lícita, deve ser aceita e levada em consideração", interpretou. Para ele, não haveria razão para anular o julgamento em razão das cartas porque a sentença não foi baseada apenas nos documentos psicografados, mas num conjunto de informações. "A consciência dos jurados é inviolável", explicou.
Outro lado
O advogado Antonio Prestes do Nascimento, que representa a família da vítima, criticou a decisão. "[A decisão] não passa de um deboche", reclamou. Na época da sentença, Nascimento apontou erros na carta para tentar desqualificar a prova. "O nome da acusada estava escrito errado", explica. Além disso, o nome do marido da acusada não era o usado pela vítima. Alcides, marido de Iara, era empregado do tabelião assassinado.
O médium Jorge José Santa Maria, que psicografou as cartas supostamente ditadas pelo tabelião Ercy da Silva Cardoso, não respondeu aos pedidos de entrevista.
Fonte: UOL
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