Disposta a evitar novos atritos com evangélicos e a Igreja Católica em ano eleitoral, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, pré-candidata do PT à Presidência, mandou a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial adiar o anúncio do Plano Nacional de Proteção à Liberdade Religiosa que legaliza os terreiros de umbanda e candomblé. Desde o ano passado, Dilma tem feito esforços para se aproximar de católicos e evangélicos.
O plano, que prevê a legalização fundiária dos imóveis ocupados por terreiros de umbanda e candomblé e até o tombamento de casas de culto, seria lançado na quarta-feira, 20, mas na última hora o governo segurou a divulgação, sob o argumento de que era preciso revisar aspectos jurídicos do texto.
O adiamento ocorre na esteira da polêmica envolvendo o Programa Nacional de Direitos Humanos, que pôs o Palácio do Planalto numa enrascada política, provocando crise dentro e fora do governo. Temas controversos, como descriminação do aborto, união civil de pessoas do mesmo sexo e proibição do uso de símbolos religiosos em repartições públicas, foram alvo de fortes críticas, principalmente por parte da Igreja.
Na avaliação do Planalto, é preciso evitar novos embates que possam criar "ruídos de comunicação" e prejudicar a campanha de Dilma. Desde o ano passado, a ministra tem feito todos os esforços para se aproximar tanto de católicos quanto de evangélicos e já percorreu vários templos religiosos.
"O programa de promoção de políticas públicas para as comunidades tradicionais de terreiro já estava adequado, mas, como é um plano de governo, precisa ser pactuado para não haver constrangimentos", afirmou o ministro-chefe da Secretaria da Igualdade Racial, Edson Santos.
Apesar de dizer que nunca é demais dar "outra passada de olhos" no texto, para maior observância à Constituição e ao Código Penal, Santos não escondeu a decepção com a ordem para suspender o anúncio do plano, que seria feito justamente na véspera do Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, comemorado ontem.
"Espero que possamos lançá-lo o mais rapidamente possível", disse o ministro, diante de uma plateia de praticantes de umbanda e candomblé, que se reuniram no Salão Negro do Ministério da Justiça. "Somos um Estado laico, mas não seremos neutros e cegos diante das injustiças e do racismo."
Reação
A informação sobre o adiamento do programa pegou de surpresa as comunidades de terreiro. Muitas mães e pais de santo viajaram de longe para assistir à cerimônia e só souberam na hora que haveria ali apenas um debate.
"Quando o governo chega na encruzilhada e tem de tomar uma decisão, recua. Será medo? Acho que sim", protestou Valdina Pinto de Oliveira, do terreiro Tanuri Junsara, de Salvador (BA). Ela foi além e conclamou a comunidade do candomblé a pensar bem em quem vai votar nas eleições de outubro.
"Está na hora de irmos para o campo político e de educar os nossos para saber quem vamos eleger", insistiu Valdina, sob aplausos. "A gente viu o que aconteceu com o Estatuto da Igualdade Racial e o que está acontecendo com esse plano. Por que para negro e índio não tem terra? Precisamos acabar com esse vírus do racismo."
Coordenador das reuniões realizadas para a confecção do plano, o subsecretário de Políticas para Comunidades Tradicionais, Alexandro Reis, tentou contornar o desapontamento geral. "A preocupação do governo é que determinados setores, por motivos eleitorais, utilizem o plano de proteção à liberdade religiosa como algo negativo", contou. Reis admitiu que o texto "precisa ser pactuado com evangélicos e católicos" para não ser contaminado pelo ambiente político de 2010. Disse, no entanto, que os terreiros não podem participar dessa briga. "Estamos tratando de um segmento que tem sido demonizado, mas não vamos violar direitos de ninguém", argumentou. Depois, garantiu que o governo continuará o mapeamento dos terreiros para nortear as políticas públicas.
Embora a Secretaria da Igualdade Racial tenha informado que a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) é solidária ao plano, a Pastoral Afro-Brasileira assegurou não ter sido consultada sobre seu conteúdo. Atualmente, apenas seis dos cerca de 10 mil terreiros são tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Para o pastor Ronaldo Fonseca, presidente do Conselho Político da Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil, o Estado não deve gastar dinheiro com tombamento de templos. "O governo está se envolvendo em polêmicas desnecessárias", comentou. "Não existe guerra santa aqui e não é inteligente o Estado se preocupar com símbolos religiosos, tombamentos e união de homossexuais. Isso é coisa de marxista."
PROGRAMA DE POLÊMICAS
21/12/2009
Governo lança a terceira edição do Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3)
22/12/2009
Contrário à criação de uma Comissão da Verdade, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e os comandantes das três forças militares pedem demissão. O presidente Lula faz um acordo: não reescreve o texto, mas garante que as propostas não afrontarão as Forças Armadas. O ministro de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, ameaça entregar o cargo caso o programa seja alterado para permitir a punição a militantes da esquerda
8/1/2010
O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, e a senadora Kátia Abreu protestam contra as mudanças na questão da reintegração de posse, que prevê uma câmara de conciliação. A Igreja Católica também protestou. Neste caso contra a proibição de símbolos religiosos em locais públicos e a descriminação do aborto
13/1/2010
O presidente Lula manteve a Comissão da Verdade, mas retirou o trecho que previa o exame de delitos da "repressão política"
14/1/2010
Embora tenha cogitado fazer alterações nos itens da descriminação do aborto e da mudança nas regras para desocupações de áreas invadidas, Lula resistiu e não mudou esses pontos
Fonte: Estadão
O plano, que prevê a legalização fundiária dos imóveis ocupados por terreiros de umbanda e candomblé e até o tombamento de casas de culto, seria lançado na quarta-feira, 20, mas na última hora o governo segurou a divulgação, sob o argumento de que era preciso revisar aspectos jurídicos do texto.
O adiamento ocorre na esteira da polêmica envolvendo o Programa Nacional de Direitos Humanos, que pôs o Palácio do Planalto numa enrascada política, provocando crise dentro e fora do governo. Temas controversos, como descriminação do aborto, união civil de pessoas do mesmo sexo e proibição do uso de símbolos religiosos em repartições públicas, foram alvo de fortes críticas, principalmente por parte da Igreja.
Na avaliação do Planalto, é preciso evitar novos embates que possam criar "ruídos de comunicação" e prejudicar a campanha de Dilma. Desde o ano passado, a ministra tem feito todos os esforços para se aproximar tanto de católicos quanto de evangélicos e já percorreu vários templos religiosos.
"O programa de promoção de políticas públicas para as comunidades tradicionais de terreiro já estava adequado, mas, como é um plano de governo, precisa ser pactuado para não haver constrangimentos", afirmou o ministro-chefe da Secretaria da Igualdade Racial, Edson Santos.
Apesar de dizer que nunca é demais dar "outra passada de olhos" no texto, para maior observância à Constituição e ao Código Penal, Santos não escondeu a decepção com a ordem para suspender o anúncio do plano, que seria feito justamente na véspera do Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, comemorado ontem.
"Espero que possamos lançá-lo o mais rapidamente possível", disse o ministro, diante de uma plateia de praticantes de umbanda e candomblé, que se reuniram no Salão Negro do Ministério da Justiça. "Somos um Estado laico, mas não seremos neutros e cegos diante das injustiças e do racismo."
Reação
A informação sobre o adiamento do programa pegou de surpresa as comunidades de terreiro. Muitas mães e pais de santo viajaram de longe para assistir à cerimônia e só souberam na hora que haveria ali apenas um debate.
"Quando o governo chega na encruzilhada e tem de tomar uma decisão, recua. Será medo? Acho que sim", protestou Valdina Pinto de Oliveira, do terreiro Tanuri Junsara, de Salvador (BA). Ela foi além e conclamou a comunidade do candomblé a pensar bem em quem vai votar nas eleições de outubro.
"Está na hora de irmos para o campo político e de educar os nossos para saber quem vamos eleger", insistiu Valdina, sob aplausos. "A gente viu o que aconteceu com o Estatuto da Igualdade Racial e o que está acontecendo com esse plano. Por que para negro e índio não tem terra? Precisamos acabar com esse vírus do racismo."
Coordenador das reuniões realizadas para a confecção do plano, o subsecretário de Políticas para Comunidades Tradicionais, Alexandro Reis, tentou contornar o desapontamento geral. "A preocupação do governo é que determinados setores, por motivos eleitorais, utilizem o plano de proteção à liberdade religiosa como algo negativo", contou. Reis admitiu que o texto "precisa ser pactuado com evangélicos e católicos" para não ser contaminado pelo ambiente político de 2010. Disse, no entanto, que os terreiros não podem participar dessa briga. "Estamos tratando de um segmento que tem sido demonizado, mas não vamos violar direitos de ninguém", argumentou. Depois, garantiu que o governo continuará o mapeamento dos terreiros para nortear as políticas públicas.
Embora a Secretaria da Igualdade Racial tenha informado que a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) é solidária ao plano, a Pastoral Afro-Brasileira assegurou não ter sido consultada sobre seu conteúdo. Atualmente, apenas seis dos cerca de 10 mil terreiros são tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Para o pastor Ronaldo Fonseca, presidente do Conselho Político da Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil, o Estado não deve gastar dinheiro com tombamento de templos. "O governo está se envolvendo em polêmicas desnecessárias", comentou. "Não existe guerra santa aqui e não é inteligente o Estado se preocupar com símbolos religiosos, tombamentos e união de homossexuais. Isso é coisa de marxista."
PROGRAMA DE POLÊMICAS
21/12/2009
Governo lança a terceira edição do Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3)
22/12/2009
Contrário à criação de uma Comissão da Verdade, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e os comandantes das três forças militares pedem demissão. O presidente Lula faz um acordo: não reescreve o texto, mas garante que as propostas não afrontarão as Forças Armadas. O ministro de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, ameaça entregar o cargo caso o programa seja alterado para permitir a punição a militantes da esquerda
8/1/2010
O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, e a senadora Kátia Abreu protestam contra as mudanças na questão da reintegração de posse, que prevê uma câmara de conciliação. A Igreja Católica também protestou. Neste caso contra a proibição de símbolos religiosos em locais públicos e a descriminação do aborto
13/1/2010
O presidente Lula manteve a Comissão da Verdade, mas retirou o trecho que previa o exame de delitos da "repressão política"
14/1/2010
Embora tenha cogitado fazer alterações nos itens da descriminação do aborto e da mudança nas regras para desocupações de áreas invadidas, Lula resistiu e não mudou esses pontos
Fonte: Estadão
Nenhum comentário:
Postar um comentário