terça-feira, 28 de julho de 2009

QUE BEM FARIA AO PAPA UM POUCO DE MARXISMO', DIZ LEONARDO BOFF

BRASÍLIA, 28 JUL (ANSA) - O teólogo brasileiro Leonardo Boff afirmou que o papa Bento XVI deveria ler Karl Marx, já que sua última encíclica, em que aborda os efeitos da crise mundial, é um documento que concorda com os fundamentos da ordem econômica vigente.
"Que bem que faria ao atual Papa um pouco de marxismo!", comentou Boff, precursor da Teologia da Libertação, dizendo que é esta a sensação que dá após ler a carta pontifícia publicada no último dia 7 com o título "Caritas in Veritate".
Para o teólogo, o marxismo interpreta a realidade "a partir dos oprimidos, tem o mérito de desmascarar as oposições presentes no sistema atual, pôr à luz os conflitos de poder e denunciar a voracidade incontida da sociedade de mercado, competitiva, consumista, nada cooperativa e injusta".
A nova encíclica de Bento XVI é uma tomada de posição da Igreja face à crise atual", resumiu Boff, que deixou os hábitos religiosos na década de 1980, quando recebeu advertências canônicas pelo então cardeal Joseph Ratzinger, que se tornou Pontífice em 2005.
O teólogo explicou à ANSA que o ponto de vista da "Caritas in Veritate" é que "o sistema mundial se apresenta fundamentalmente correto. O que existe são disfunções e não contradições".
Segundo Boff, tal teoria é parecida com a defendida pelo G20 (grupo formando pelos países ricos e pelos emergentes). "Retificações e não mudanças, melhorias e não troca de paradigma, reformas e não libertações", pontuou.
"A crise que atinge a humanidade e que comporta ameaças severas a todo sistema da vida demandaria um texto profético, carregado de urgência. Mas não é isso que recebemos, senão uma longa e detalhada reflexão sobre a maioria dos problemas atuais que vão da crise econômica ao turismo, da biotecnologia à crise ambiental", ressaltou o teólogo.
"Mas não é da natureza deste Papa ser profeta. Ele é um doutor e mestre, elabora o discurso oficial do Magistério, cuja perspectiva não é partir debaixo, mas de cima, da doutrina ortodoxa que esfuma as contradições e minimaliza os conflitos. A tônica dominante não é a da análise, mas da ética, do dever-ser", afirmou Boff.
O teólogo ainda afirmou que "como não faz análise da realidade atual, extremamente complexa, o discurso magisterial permanece principista, equilibrista, e se define por sua indefinição. O subexto do texto, ou o não-dito no dito, remete a uma inocência teórica que inconscientemente assume a ideologia funcional da sociedade dominante".
Doutorado em Teologia na Alemanha, o brasileiro foi influente na Igreja Católica do país entre os anos 70 e 80, quando a Conferência Episcopal Brasileira tinha como membros religiosos progressistas, como Paulo Evaristo, ex-cardeal de São Paulo.
A "Caritas in Veritate" foi publicada em coincidência com a realização da 35ª Cúpula do G8 (grupo formado por Estados Unidos, Canadá, França, Itália, Rússia, Japão, Reino Unido e Alemanha) na cidade italiana de L'Aquila.
Especialistas consideram esta carta papal como a primeira encíclica em que são abordados temas sociais, econômicos e éticos.
No documento, Bento XVI defendeu que o desenvolvimento econômico permite que milhões de pessoas deixem a miséria, mas alerta sobre as consequências que as ações de instituições financeiras podem exercem na sociedade. O Papa também ressaltou que toda atividade econômica deve ser regida por ética e responsabilidade. (ANSA)
28/07/2009 09:26

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