segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Novo arcebispo condena "teologia da retribuição"

O novo arcebispo de Olinda e Recife, Dom Antonio Fernando Saburido, 62 anos, condenou neste domingo (16) o que chamou de "Teologia da Retribuição", adotada por igrejas evangélicas, como a Universal do Reino de Deus - cujos líderes respondem a processo por formação de quadrilha e lavagem de dinheiro - que adotam a premissa do "se você dá, Deus devolve". Ele demonstrou preocupação com a facilidade de se abrir igrejas como se fossem casas comerciais - "É um perigo muito grande, Igreja é coisa muito séria" - e destacou que a religião deve pregar a prosperidade espiritual e não a prosperidade econômica.

"Deus é desprendido, Deus é amor, Ele faz as coisas gratuitamente", destacou na sua primeira entrevista coletiva à imprensa, realizada no Mosteiro de São Bento, em Olinda, antes da cerimônia, à tarde, em que assumiu a Arquidiocese, em substituição ao conservador Dom José Cardoso Sobrinho, na Igreja da Madre de Deus, no Recife. "Deus providencia tudo quando amamos o Evangelho e procuramos fazer a Sua vontade. Tenho muito medo dessas disputas religiosas", acrescentou, ao lamentar a mercantilização da fé, exemplificada com um caso que vivenciou quando pároco de Ouro Preto, em Olinda: uma pessoa de sua confiança encontrou um amigo comerciante e ao perguntar se os negócios iam bem, ele respondeu que tudo estava ótimo desde que tinha fechado seu comércio e aberto uma igreja.

Num claro discurso de conciliação, em que pretende unir a Arquidiocese de Olinda e Recife - que engloba nove dioceses, com 101 paróquias distribuídas em 19 municípios -, o arcebispo deixou claro que nenhum segmento da Igreja Católica ou da sociedade será excluído do trabalho a ser realizado e que visará principalmente os pobres. "Precisamos somar forças, todos temos o mesmo objetivo, o de ter uma igreja comprometida com o povo, especialmente os mais carentes e assim darmos passos significativos na evangelização".

"A opção pelos pobres, muito reforçada na Quinta Conferência do Episcopado Latino Americano e Caribenho (Celam) não pode ser uma teoria, tem que ser uma realidade, a Igreja tem que dar oportunidade a todos", reforçou. "Todos são bem vindos, qualquer pessoa, em qualquer situação, homossexuais, prostitutas, todos que têm situação difícil do ponto de vista social". Ordenado pelo progressista Dom Hélder Câmara, que foi sucedido por Dom José Cardoso Sobrinho - responsável pelo desmonte da estrutura instalada pelo seu antecessor - dom Fernando Saburido disse que irá imprimir o seu estilo próprio na arquidiocese, aproveitando as experiências positivas dos dois religiosos.

Elogiou dom José Cardoso, a quem disse ter admiração pelo seu amor à Igreja, adiantando que irá estimular o Movimento Pró-Criança, criado na sua gestão para resgatar crianças de rua. Ao mesmo tempo, antecipou que irá reavivar entidades da época de Dom Hélder que foram extintas por Dom José, a exemplo de pastorais sociais, a Comissão de Justiça e Paz, o Instituto Teológico do Recife (Iter) e o Seminário Regional do Nordeste (Serene). O arcebispo frisou, no entanto, que todas as mudanças serão definidas por consenso, em assembleia, ouvindo a todo o clero. Sem se furtar a responder nenhuma das perguntas dos jornalistas, ele disse que a Igreja deve ter "tolerância zero" com a pedofilia, "que deixa "chagas profundíssimas" nas crianças e não pode ser aceita.

NASCEMOS PARA SER FELIZES

Bispo auxiliar de dom José Cardoso de 2000 a 2005 e ex-bispo de Sobral (CE) nos últimos quatro anos, o novo arcebispo disse ser de linha missionária. Como tal irá dar atenção especial às santas missões populares, com as quais irá contar para enfrentar a evasão religiosa e atrair os que se dizem sem credo. "Antigamente se fazia missões através de congregações religiosas, atualmente é todo o povo de Deus", afirmou. A linha missionária a ser seguida, segundo ele, é a de que "todo mundo tem de ser feliz a partir da palavra de Deus". Se o Evangelho não nos proporcionar essa mudança, estamos perdidos, não estamos entendendo nada, absolutamente nada".

Ele elegeu a violência e a insegurança - tema da Campanha da Fraternidade - como um dos graves problemas sociais da atualidade, com as pessoas matando por brincadeira, num total desrespeito à vida. Mas não entende que se use a insegurança como justificativa para se manter as igrejas fechadas. "As pessoas precisam de espaço para se encontrar, para conversar e o templo é para facilitar esse contato com o povo".

Lembrou que muitos partem para a violência por falta de opção de sobrevivência, por isso citou também o desemprego, a falta de acesso à educação, à moradia e a ineficiência do Sistema Unificado de Saúde (SUS), como sérias questões sociais que precisam ser assumidas e enfrentadas "com a ajuda da Igreja, pela força da pressão da comunidade".(AE)

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